Grandes Vinhetas # 9 (exercício para exorcizar o resultado desta noite)
"Obviously one must hold oneself responsible for the evil impulses of one's dreams. In what other way can one deal with them? Unless the content of the dream rightly understood is inspired by alien spirits, it is part of my own being."
Sigmund Freud
Não há muita banda desenhada de qualidade que se envolva no futebol ou, a que há, é demasiado infantil ou mal executada para poder ser apreciada pelos mais velhos ou os mais exigentes. É por isso que, tal como no post anterior, estas pequenas pérolas do Maradona da BD - Franquin - são tão valiosas.
Obviamente, a vinheta acima é apenas parte de um saboroso sonho. E digo obviamente porque quem conhece o marcador do golo, Gaston Lagaffe (nascido a 28 de Fevereiro de 1957, no n.º 985 do jornal "Spirou"), sabe que estamos, pura e simplesmente, perante o maior dos desastrados e que, sempre que entra num recinto desportivo, são maiores as probabilidades de um golo na própria baliza do que na baliza do adversário.
Nos pontapés que vou dando ocasionalmente na bola, julgo não ser tão desajeitado como este anti-herói, mas infelizmente não navego em águas tão longínquas das do Gaston Lagaffe, como tanto gostaria. É por isso que, desde miúdo, e tal como a personagem de Franquin, imagino-me a marcar golos aos adversários do meu clube, em posturas tão elegantes como impossíveis para os meus dotes físicos, tal qual as que Gaston fantasia na vinheta reproduzida.
De todos os meus sonhos futebolísticos, o maior, aquele que me persegue há uma vintena de anos, é o de marcar, vestido de azul e branco, em pleno Estádio da Luz. Tantas vezes sonhei com esse momento utópico, que detalhei os 90 minutos na minha cabeça, durante os momentos escuros e solitários da minha meninice, mesmo antes de adormecer, noites e noites a fio.
Com um estado de tempo enevoado, marcado pela chamada morrinha (para os que não são do Porto - chuva miudinha), o jogo decorre ao princípio da noite. Eu jogo na clássica posição seis, conhecida, de há uns anos para cá, por trinco, cortando braviamente os lances de ataque do adversário que nos pressiona com insistência (na década de 80, quando íamos jogar a Lisboa, isto acontecia com frequência. Agora é o que se sabe). O árbitro já me tinha avisado que não podia ter a camisola por fora dos calções, e eu insistentemente voltava a colocá-la de fora assim que podia, num estilo muito Soren Lerby (deste, não sei se haverá muita gente a lembrar-se...).
Por volta dos 60 minutos, o extremo direito do Porto (na altura, Jaime Magalhães) inicia uma jogada rápida pela direita, que deixa o Benfica em contra pé, e cruza tenso para a área, sendo a bola rechaçada por um central do Benfica (seria o Mozer?), um tanto atabalhoadamente, para o seu meio campo.
Aí, vindo rápido de trás, e com apenas um toque, controlo a bola e preparo o pontapé para o meu pé direito, que dispara violentamente ao canto superior esquerdo da baliza, sem hipóteses de defesa para o guarda-redes benfiquista (Bento?).
Em câmara lenta, um sorriso invade a minha cara assim que começo a ouvir o silêncio profundo do estádio, apenas interrompido pela pequena claque azul e branca, criando um desequilíbrio perturbador. Em posição errática, mas aerodinâmica e com o resto da equipa atrás de mim, corro em direcção à claque do Benfica com o punho em riste, em clara postura de desafio (não escapando a uns isqueiros que me acertam sem dor), e termino a longa corrida junto aos entusiásticos adeptos do Porto, agarrado à vedação onde a pequena falange de apoio me acarinha e celebra enlouquecida o golo.
Nessa altura, em minha casa, os meus pais, irmã e madrinha vibram com o que ouvem no Quadrante Norte, enquanto o mítico Gomes Amaro, ao som da eterna melodia: "Que bonito é, as bandeiras tremulando, a torcida delirando, vendo a rede balançar", grita "É Golo! Goooolo! Um «tiro» fulminante! Ah sim! Este rapaz é o melhor centro campista europeu!!", com aquela pronúncia que adocicava cada jogo do meu Porto de infância.
Acabo assim por ter melhor sorte que Gaston. O meu sonho termina, adormecendo com o doce sabor da vitória, enquanto Gaston é acordado com um amargo grito de Prunelle (o seu superior): "Lagaffe! Você é o pior empregado de escritório do mundo!"
Proponho aos seguintes indefectíveis portistas, que leio atenta e diariamente porque têm dos melhores blogues portugueses, que coloquem nas suas moradas, onde e como marcaram o seu golo de sonho vestidos de azul e branco (como somos tantos, qualquer dia organizamos uma futebolada):
- Pedro Olavo Simões, da Fonte das Virtudes.
- Francisco José Viegas, de A Origem das Espécies.
- Bruno Sena Martins, do Avatares de um desejo.
- Paulo Costa, do Bisca dos Nove.
- André Moura e Cunha, do In Absentia.
- Rui Curado Silva, do Klepsýdra.
- Tiago Barbosa Ribeiro, do Kontratempos.
- Manuel Jorge Marmelo, do Tatarana.
- Guarda Abel, do Pobo do Norte.
- Aníbal Letra do FêCêPê: Orgulho e Glória
- João Saraiva, do Óculos Azuis e Brancos.
- R. Castro Ferreira, do Solas na Mesa.
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Nota:
De facto, Pedro, não há pachorra!
Etiquetas: Banda Desenhada, Futebol, Psicanálise
10 Carruagens:
Ola' campeao! Ate' a minha casa tremeu qd marcaste o golo :-)))
Fiquei deliciada com este teu sonho. E' tao bom ver que o Benfica permanece no teu inconsciente e que ocupa o teu imaginario... :P
Entao e quantas claviculas partiste nesse jogo?
Goooooooooooooooooooooooooooooooooolo
ehehehehe Por isso é que não foste jogar no domingo.
Foi um 2 contra 2 e o jogo ficou uns trinta e tal - vinte e tal.
Também já fiz muitas vezes esse exercicio.
O grande albertini Caprini, o fantástico Paolo Sposa.Grandes jogadores que tantas vezes às tantas da manhã esmagaram o milhafre.
Abraço
Foi neste domingo. Grande golo... parecia o Belanov. Foi pena não teres estado lá para veres. Eh Eh Eh...
Soren Lerby... o dinamarquês que jogou no Liverpool, salvo o erro... :)
Hei-de aceitar a proposta e no Pobo do Norte colocarei a história do dia em que pensei (não sonhei) ser Rabah Madjer :)
Caro JRP,
Não te esqueças do Pedro Vieira do Irmaolucia e do Daniel do B-Site.
No meu caso tentarei postar uma surpresa que devo ter guardada na minha arrecadação... e mais não digo.
Abraços,
André
:-) Estou tentado a responder ao desafio, mas a coisa implicará algum tempo e disponibilidade mental (o assunto FCP é demasiado importante)... a ver vamos. Abraço.
Kate,
Admiro esse teu fair-play benfiquista :-)
Nesse jogo, não parti nenhuma clavícula!
beijinho
PCS e Luís,
Desculpem a ausência... não foi mesmo possível! E que tal se ficar para as 16h30?
Toca a pôr as vossas versões nos vossos blogues!
Tinh que vir o Belanov, esse mítico e injustiçado craque da nossa CCCP!
Guarda Abel,
Aguardo por essa história! O Lerby era um craque!
André,
Pedido cumprido. Aguardo por essa surpresa!
Abraço,
Pos,
Acho bem que seja tratado com importância. Estou à espera e toma o tempo que quiseres.
Abraço,
Jorge Ricardo Pinto
JRP:
Já sonhei mais com isso... mas ainda me lembro quando adormecia a pensar em mim vestido com a camisola azul e branca.
Aceito o desafio... tendo um tempinho... vai saír um sonho fresquinho no FêCêPê. E organize-se a tal futebolada... era gajo para...
Abraços,
Aníbal
Só para avisar que vou participar nesta iniciativa no novo blog:
http://renteriamejoramigo.blogspot.com
Caríssimo:
Reparei no desafio, mas ainda não tive trempo de lhe responder.
Um abraço
MJM
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