segunda-feira, julho 30, 2007

Jóia

O Porto para lá da estação. A quinta da Bonjóia e a Igreja de Santa Maria de Campanhã, anteontem à noite.

The Cranes - Jewel

O Porto, a altas horas da madrugada.
Prefiro esta gente da noite, suspeita
da hostilidade de uma cidade de arestas, extorsões,
pequenos raptos. Chegam de todas as sombras e cumprem
o destino de ir e voltar, um rumor os espera, as colunas
de treva do anonimato, as praças de recontros fortuitos,
o tráfico de uma droga qualquer que os mantenha vivos.
Páram,
perscutam. A transgressão maior é permanecerem.
E apenas a loucura dos dias os pode constranger.
Aproximam-se e entregam ao silêncio um idioma fulgente,
o cigarro
ilumina-lhes o rosto onde está um sorriso a acicatar
a desordem, a expressão da deriva, um fumo
que se não vê.


Amadeu Baptista (1999) Arte do Regresso

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Cinematográfico

O cenário portuense como nós o vimos de Gaia, ontem à noite.

Rodrigo Leão - Cinema
Porto à noite

A noite desce... Com que lentidão
Comigo ela se deita!
E luminosos os anúncios vão
Tornar a vida em nós menos estreita.

Em cada rosto esfolha-se uma rosa
E cada ruga já desaparece!
E a carne, a minha carne voluptuosa
Sôfrega vai de encontro a qualquer prece

Voltam as ruas a imitar os rios
(Há quem deslize, às vezes, como um barco...)
Voltam a encher-se os corações vazios
Nesta cidade embandeirada em arco.

Sapek-Adubos; Tagus ou Bonança?
Jardim suspenso cujo aroma diz
Que os homens crescem quando a noite avança
A desprendê-los, quase, da raiz.

Cidade rubra ao longe e, ao perto escura
Gula insaciável de vilanovenses!
De que poetas andas à procura
Se aos meus poemas ávidos pertences?


Pedro Homem de Mello (1974) Ecce Homo
_____________________

A ler:
1 -
Esta carta de Paulo Ventura Araújo, no Dias com Árvores.
2 -
Este post e artigo associado, do presidenciável J. A. Rio Fernandes.
3 -
Este texto de Nuno Markl, com que concordo da primeira à última linha.

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sábado, julho 28, 2007

Grandes Vinhetas # 17

Retirado de "Humpá-pá - Missão Secreta" (1960) Goscinny/Uderzo.

The Thrills - One Horse Town

Antes da criação de Astérix para a revista Pilote em 1959, Goscinny e Uderzo haviam já criado 3 heróis. Tudo havia começado quando casualmente foram colocados lado a lado na delegação de Paris da World Press em 1951, despoletando uma das duplas mais profícuas e cativantes da BD da segunda metade do século XX.
Dessas três personagens, de pouco sucesso sublinhe-se, a mais popular foi Humpá-pá, um nativo americano dos Sávanás, sempre acompanhado do seu amigo Humberto da Massa Folhada, oficial francês incessantemente de peruca branca.
A trama decorre no século XVIII, durante a colonização francesa da América, nunca atingindo porém o brilhantismo, o humor e sobretudo a popularidade de Astérix, Obélix e companhia, ainda que o traço de Uderzo mantenha a qualidade que o celebrizou ao longo da série daqueles que “apenas temem que o céu lhes caia em cima”.
Mas, como os últimos álbuns de Astérix com Uderzo a solo o provam (desde a morte de René Goscinny a 5 de Novembro de 1977), o sucesso da irredutível aldeia gaulesa residia sobretudo na assinatura de Goscinny, que conferia ao texto o ritmo inebriante e a trama irresistível que fizeram de Astérix e Obélix ícones de gerações atrás de gerações, nas últimas cinco décadas, um pouco por todo o mundo. E esse ritmo, esse encadeamento de episódios hilariantes na sua riqueza contextual ou no mais puro gag Chapliano, assoma também com frequência nas aventuras de Humpá-pá, justificando em absoluta a sua leitura em bibliotecas ou a compra em alfarrabistas, nas edições da Livraria Bertrand ou da Meribérica/Liber. Sem jamais deixar de caricaturar as duas formas de estar, leia-se índios nativos americanos versus sociedade francesa setecentista, Goscinny (auxiliado pelo grafismo vivo e familiar de Uderzo) aproxima os dois pólos antagónicos com a imensa e fiel amizade entre Humpá-pá e Humberto da Massa Folhada, mas, ao mesmo tempo, com as inúmeras confusões e mal-entendidos que a sobreposição dos dois contextos acaba por criar.
As duas vinhetas acima, retiradas de um álbum que faz parte de uma trilogia (Piratas/Missão Secreta/Contra os Maus-fígados), foram originalmente publicadas na incontornável Revista Tintim em 1960 e apresentam uma dessas infindáveis barafundas entre as duas realidades, no caso aplicada à língua ou, melhor dizendo, à forma de se expressarem as duas personagens.
E é nesta dialéctica, da diferença e do contraste, que os dois mundos se aproximam, sem bons nem maus colectivos, mas com boas e más sementes em ambas as margens do oceano.
_____________

Leituras:
1 - Sobre o tema: "Fusão Porto/Gaia", ler
este texto do Taf no A Baixa do Porto e este do Pedro Olavo Simões no Fonte das Virtudes.
2 -
Este post do Carlos Romão, no Cidade Surpreendente.
3 -
Este tratado no De Rerum Natura, de Palmira F. Silva.
4 -
Esta descoberta no Solas na mesa.
5 -
Todos os textos do *

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sexta-feira, julho 27, 2007

Ver o outro lado

A igreja da Lapa e a torre do edifício da Câmara, no passado dia 24 de Julho.

Mazzy Star - Halah

Lapa, à hora dos funerais

Na cidade
uma torre
de granito

Na rua
a um dia
sucede um outro dia

Pela tarde
os sinos
trá-los o vento ao sótão

lembram
as horas que passam

toda a solidão do mundo


João Pedro Mésseder (1997) Fissura

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quinta-feira, julho 26, 2007

A caminho do mar

O Porto, a ponte da Arrábida e o caminho para o mar, ontem à noite.

Suede - By the sea

Cidade

Imensa, troglodita, ambiciosa,
vai a cidade até à praia;
perdeu no campo as rochas cor-de-rosa,
e o mar, se a busca, evita-a, não desmaia,
antes se ergue negro contra o desconforto.

O rio leva casas debruçadas
que já, com o tempo, foi cavando em arcos
de perfil sem cal, inclinado e morto...
e leva também barcos.

No céu, as nuvens correm desviadas,
enquanto o Sol, em dardos, sobre o mar as crava.


Jorge de Sena (1946) Coroa da Terra
__________________________________

Algumas perguntas:
1 - Como irão reagir o
Bruno e o Francisco a este texto do Tiago?
2 - Como é que se arranja tanto tema sobre
trânsito? (tens mais jeito para perguntas que eu, Ricardo...)
3 - Porque é que
estes dois fabulosos textos nunca fizeram parte destes apontadores?
4 - Porque é que eu demorei tanto tempo a colocar o
Abencerragem na barra lateral? (A propósito, o Ricardo Alves está de acordo comigo no caso "Tintim no Congo". Seremos só nós os dois?)
5 -
Ah, olha, que coincidência, curioso, não é?

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quarta-feira, julho 25, 2007

Debaixo da ponte

A ponte Luís I vista ainda há pouco do outro lado do rio.

The Smiths - Still Ill

A Ponte das Parcas

certa vez morri suspenso na ponte de d.luís
com a angústia da noite atravessada na garganta: a certa certeza
é que (depois) a luz desmantelou os enigmas
com a crueza da cor e por isso se diz que a luz é um mistério.
morri de outra vez na rua de belmonte com a pide nos calcanhares
mas só mais tarde descobri em palmela a rua de nenhures.
no tempo dessa morte havia o turno da noite
que castrava as palavras e o medo era a alma.
ah!: e também morri outra noite no abandono dos aliados
com o néon dos ciúmes a atazanar-me os olhos.
a contabilidade das minhas mortes
usa o norte dos desassossegos quando a noite
é má conselheira entre o álcool do rio
e a mesa de cabeceira.

durante o dia suponho que uma vez morri
(faz tempo) entre o pânico e a esperança com a pressa
terrível das salvações - sempre assim morremos
porque as barcas nunca suportaram os sentimentos.
por isso aprendi nos séculos
que menos tememos a morte que os medos.

lição destas coisas:
entre porto e gaia
(entre a margem e a margem)
de morte em morte se faz a aprendizagem.


Nuno Rebocho (2002) Cantos Cantábricos.

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terça-feira, julho 24, 2007

Porque as pedras não falam, pergunta às árvores.

A Igreja do Bonfim como eu a vi, hoje à noite no caminho oriental portuense.

Pulp - The trees

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sábado, julho 21, 2007

Fé?

A fachada norte da Praça do Infante como a vimos a 1 de Setembro de 2004.

The Dears - Don't lose the faith

O Infante D. Henrique

Em seu throno entre o brilho das espheras,
Com seu manto de noite e solidão,
Tem aos pés o mar novo e as mortas eras -
O único imperador que tem, deveras,
O globo mundo em sua mão.

Fernando Pessoa (1928) Mensagem

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Não irei jurar sobre a ausência da palavra Tintim no Comboio Azul, num futuro próximo. Este programa maldito das vinhetas que aqui lancei raízes acabará por me conduzir novamente a Hergé.
Mas aceito o difícil repto,
Rogério. Este assunto fica por aqui, até para não nos arrastarmos em repetições mascaradas de novas roupagens.
Feitas as contas, parece-me que discordamos sobretudo na aplicação do rótulo e na leitura feita de pré-conceitos do adulto perante a ausência de contexto ou ingenuidade da criança. Daria ainda uma bela discussão sobre a perenidade do conceito de
criança ao longo do século passado e dos seus estádios de desenvolvimento individual. Mas, sinceramente, estou de acordo contigo e acho que já chega, até porque duvido ter ciência e retórica para tanto. Lá estão novamente as dúvidas. Mas fico satisfeito que, ainda que continues a desgostar dos meus textos, tenha sido possível perpassar discretamente a consciência que tenho sobre a inflação óbvia do meu primeiro post, objecto provocatório (e até primitivamente reactivo!) ao irritante consenso dos "guerrilheiros anti-sistema" (é claro que só aqui e agora, nesta espécie de nota de rodapé, assumo isto!) que tanto nos irritam aos dois.
Vá lá, outra certeza me parece assolar afinal. Agora que se coloca um ponto final neste arrufo, "eu e o JRP Rogério Casanova estaremos provavelmente do mesmo lado". Valeu.

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sexta-feira, julho 20, 2007

Grandes Vinhetas # 16
(Adenda a Grandes Vinhetas #15)

Página alterada da versão escandinava de "Tintim no Congo", feita por Hergé a pedido dos seus editores locais.

Morrissey - National Front Disco

"(…) O outro resultado tangível do processo foi a oferta - na já cansativamente habitual bandeja perfumada - de munições aos guerrilheiros anti-sistema, os tais patrulhadores dos patrulhadores que tanto irritam o Comboio Azul e que tanto me irritam a mim, e que rejubilam à menor oportunidade para fulminar a «tirania do politicamente correcto», que, de resto, se assemelha cada vez mais à caricatura imbecil que dela fazem.."
Rogério Casanova (2007) Pastoral Portuguesa

Quando escrevi o post Grandes Vinhetas # 15, a propósito da (recente, mas não mais que reeditada) polémica em torno do álbum "Tintim no Congo", desde logo imaginei (e sobretudo desejei) que um coro de assobios se lhe seguisse. Enganei-me. Recebi apenas dois comentários com um "concordo, mas...", precisamente de dois dos bloggers que mais admiro: o Francisco Curate e o Pedro Olavo Simões. Eu bem me meti com o André Azevedo Alves, o Miguel Portas, o Victor Abreu, o João Távora e o Pedro Guedes, correndo praticamente todo o espectro político, arriscando, nestas coisas dos consensos, acabar como o patinho feio. Mas, nem assim. Ninguém me ligou pevide.
Acabou por ser o improvável Rogério Casanova, do mítico Pastoral Portuguesa, a anunciar que não tinha gostado "mesmo nada deste [desse] post".
A justificação, grande em todos os sentidos, parte de um pressuposto: sou um homem de certezas. Lamentavelmente, Rogério, não o sou. Aliás, aproveitando o sub-título da Pastoral Portuguesa, "I am [too!] learning how not to feel strongly about anything". Mais, tenho para mim que esse tem sido o grande ensinamento que venho recebendo desde que abandonei a adolescência (ainda que, um dia, há alguns anos atrás, alguém me tenha acusado de ser um adolescente tardio...). Cada vez tenho mais dúvidas e menos certezas.
Mas o pressuposto justifica-se. Comecei o texto com um arreliador: "Não tenho dúvidas". Na verdade, e julgando que tinha deixado isso claro no texto, a única certeza que tinha era que "Tintim no Congo" é o pior álbum de Hergé (e até sei que tu, Rogério, alinhas nisto comigo). No resto, o texto é uma antítese da primeira frase. Dúvidas a rodos.
O Rogério disserta depois sobre a inflação que nota nas minhas palavras "racista, desumano e cruel". Por momentos julguei que havia cometido um erro entre muitos. Pensei logo em me refugiar no tardio das horas a que escrevo ou então, pura e simplesmente, teria que aceitar que havia caído no erro que tantas vezes aponto e que até agora julgava abominar: também eu pertenço à malta que vê discriminação em tudo o que mexe. O Rogério socorre-se do dicionário. Racismo é uma "«doutrina que tende a preservar a unidade da raça e assenta na suposta superioridade de uma raça que se confere o direito de exercer domínio sobre as outras», e também como «hostilidade face a um grupo étnico diferente»". Ora, julgo não estar muito para além das capacidades hermenêuticas de ninguém percepcionar que o álbum "assenta na suposta superioridade de uma raça que se confere o direito de exercer domínio sobre as outras".
Exemplo? O episódio do comboio na página 20 da Verbo. Para quem não possui a obra, fica a descrição: Um comboio descarrila porque o carro de Tintim fica preso nos carris. Tintim ordena aos passageiros que o voltem a pôr nos carris. Estes, de lábios grotescamente inchados, revelam pouca vontade para o trabalho. "Eu estou muito fatigado", responde um deles. "Mas... Mas... Vou sujar a mim", replica um outro de colarinho, gravata, punhos, mas sem camisa. A cena termina com um africano a comentar com outro: "O siô branco ser muito esperto". Mas atente-se à vinheta em que Tintim, com expressão facial irada, pergunta: "Então? Todos ao trabalho! Não têm vergonha de deixar este cão trabalhar sozinho?" No meu entender, esta vinheta contém a maior dose de racismo (isto já vai em doses... Não tenho mesmo juízo). Milou (o tal que acabará por ascender a rei dos pigmeus!) empurra a locomotiva sozinho e pensa/ladra: "Vamos, bando de mandriões, toca a empurrar!" Enquanto isso, Tintim mantém-se em postura supervisora, deixando a Milou e aos africanos o trabalho e limitando-se a vociferar umas ordens. O Rogério chama-lhe "sobranceria colonial". Para mim, "assenta na suposta superioridade de uma raça que se confere o direito de exercer domínio sobre as outras".
Depois, o Rogério penetra num debate muito interessante que resumidamente pode ser apresentado sob esta forma: "Se o «Tintim no Congo» deve sair da estante dos mais novos, então não deveriam muitas outras sair também?" Ora, Rogério, essa é precisamente a demanda do meu post. A dificuldade em definir a fronteira. E essa definição não é tão clara e fácil de traçar como os "patrulheiros dos patrulheiros" quiseram passar.
Deste o belíssimo exemplo de Astérix. Julgo que ninguém duvida, apesar de tudo (e da tua leitura das camadas de significado), na diferença entre a violência de Tintim no Congo e de uma qualquer obra de Astérix (e mesmo de Wild E. Coyote!). Em nenhum momento, e sem querer entrar em questões ligadas à morte (que nunca acontece aos romanos), ou às experiências funestas com animais (apesar dos javalis de Obélix), repito (pareço o Malheiro, Deus me livre!), em nenhum momento, Astérix tem "sobranceria colonial", e mesmo a relação com os romanos, com os javalis ou a padronização frequente de espanhóis, ingleses, portugueses, e por aí fora, é seguramente menos violenta (ou melhor, nem sequer há violência) que todas as cenas cruas de "Tintim no Congo", que enunciei no post que despoletou este nosso debate. Aliás, se assim não fosse, porque é que os editores escandinavos (dos países dos cartoons que escandalizaram o Islão!) pediram a substituição daquelas 4 tiras pelas que coloco na imagem acima? (a propósito, já as conhecias?)
Assim como, e perdoa-me nova e clara inflação, mas aproveitando a deixa das comparações, o "Tintim no Congo" é ideologicamente menos radical que "Mein Kampf" ou menos violento que "American Psycho". Podemos incluir estes dois na estante infanto-juvenil?
Sobre o meu aplauso à solução final encontrada, pareceu-me um mal menor. Seguramente que tanto barulho criado pela CRE foi um tiro no pé e, tal como escrevi, pareceu-me radical e desmesurado, contribuindo inclusivamente para uma maior propaganda da obra. Agora, a partir do momento em que o barulho estava feito e a promoção indirecta também, as livrarias tomaram uma posição defensiva, mas, ainda assim, bem melhor que a fogueira de livros (tão querida do autor de "Mein Kampf"), a proibição da reedição do livro ou como a página que acima reproduzi mostra, reescrever a história e a estória, como acabou de certa forma por se repetir com o cigarro de Lucky Luke.
Aproveito, por isso, (até porque, apesar de não teres gostado mesmo nada do meu post, eu gostei muito do teu e parece-me que estamos mais próximos que afastados no tema) para respigar o fim perfeito da tua prosa: "Falsificações do passado, por menor que seja a escala, e por mais benignas que sejam as intenções, nunca melhoraram o futuro de ninguém. Sobre isto, pelo menos, tenho muito poucas dúvidas". Eu também.

Adenda à adenda:
1 - No "A Memória Inventada", Vasco Barreto colocou a página do episódio do comboio que referi acima. A preto e branco e em francês.
2 - Assim de repente, como seria de esperar, a lista dos "patrulheiros dos patrulheiros" aumenta. Mais textos para o consenso: no Nonas, no Escrita Casual, no Nêspera, no Holocausto, no Briteiros, no A interpretação do tempo, no O Povo e no Tascuscopos.

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quinta-feira, julho 19, 2007

Mesmo sem começar

O Atlântico, como eu o vi a partir da barra do Douro, 28 de Julho de 2004.

The Stones Roses - Waterfall

(Nota prévia do autor: "Na adolescência, o Mar da Foz do Douro entrava, durante as férias, no meu destino.")

Assim o mar. Ainda hoje o ouço sem o ouvir
na espuma como dantes nos paredões da Foz.
(«Cala-te» - ordenei-lhe mais tarde com outra voz.)
Mas aos vinte anos andava eu de penedo em penedo,
de praia em praia, de sol em sol, em busca do cofre
onde fechara este segredo,
agora finalmente revelado:
«não há vida nem morte,
mas um conjunto
de sonho,
futuro,
presente,
passado
- angústia de mesmo sem começar, tudo ter acabado há
muito».

José Gomes Ferreira (1978) Poeta Militante

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quarta-feira, julho 18, 2007

Pequenas folhas

O Porto visto da Torre da Marca, no princípio de Julho de 2007.

Lush - Lovelife

Cidade Equestre

A cidade equestre
No rio mergulha
Seus cascos de granito
E sobe
A galope
Encosta arriba

Num salto a prumo
(Lá onde o casario morre)
Upa!
É uma torre

Torre de pedra e nuvem
De pássaros de fogo
De corpo de mulher
Torre de tudo e de quanto
O sonho a palavra o canto
Pode e quer
.
Luís Veiga Leitão (1985) Figurações

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terça-feira, julho 17, 2007

Grandes Vinhetas # 15
(Para maiores de 18 anos)

Retirado de "Tintim no Congo" (1931) Hergé.

Billy Bragg - Sexuality

"(…) Incapaz de dominar-se, baixou a cabeça, tomou-o entre os lábios húmidos, enrolou-o na boca, humedeceu-o com a saliva quente e pareceu nunca mais se cansar da brincadeira."
Guy de Maupassant (1880) As sobrinhas da viúva do Coronel.

Não tenho dúvidas. O álbum "Tintim no Congo" é seguramente o pior momento da obra de Hergé. E diga-se, não sou só eu que o acho... o próprio acabou por o definir como "um pecado da juventude".
O álbum é, de facto, péssimo. Racista, desumano e cruel, se o virmos pelo prisma da sensibilidade humana contemporânea, mas também tonto, desinteressante e errático, no que diz respeito à qualidade do enredo, e até sensaborão, insípido e desacertado no que ao desenho se refere. Mas então, porque é que escolho esta vinheta?
Como consequência da notícia sobre a decisão britânica da passagem do álbum das prateleiras dos mais novos para a secção de adultos, após protesto da Comissão Inglesa pela Igualdade Racial (que se refere ao livro desta maneira: "O único lugar aceitável para um produto destes é num museu, mas com um grande anúncio ao lado a dizer «Treta racista e retrógrada!»"), uma série de reacções de repúdio surgiram na net, da direita à esquerda, lembrando a popularidade do álbum no Congo e apelando à contextualização da obra.
Certo. A obra é de 1931 e reflecte a colonialismo em marcha, consequência do exacerbamento dos nacionalismos, que duravam desde finais de XIX, e que acabarão por redundar ainda na II Guerra Mundial.
Concordo. A obra terá uma enorme aceitação na África Francófona, demonstrando que estes não se intimidam com as claras referências racistas (bem mais que paternalistas, como já vi por aí escrito).
Mas, sinceramente, não entendo o incómodo que a todos criou. Não acham natural que uma Comissão pela Igualdade Racial se manifeste contra um livro racista? Para quem não leu a obra, a vinheta acima julgo ser suficiente. Tintim pergunta a uma turma de crianças negras quanto é 2+2 e não obtém resposta, mesmo depois de insistir (coisa que aliás continuará a fazer em vinhetas posteriores, sempre sem sucesso). Noutras vinhetas, Tintim deparar-se-á com a preguiça de um conjunto de negros, com erros sucessivos na oralidade e superstição extrema, com a subida de Milou ao trono dos pigmeus, com a mesquinhez na disputa por um chapéu e com a estupidez pela solução final, e por aí fora. Aliás, o rol seria muito maior não fossem as correcções de Hergé de 1946 para a versão colorida, em que, por exemplo, o traficante de animais para os zoos europeus deixa de ser negro para ser um branco.
No meu entender, todas estas razões seriam suficientes para a retirada do livro da estante dos mais novos. Para estas realidades, da violência, discriminação e racismo, já chegam as imagens e as palavras que os noticiários vomitam sem contenção, a qualquer hora do dia, para todos os públicos, incluindo o mais jovem.
Mas, lamentavelmente, a extensão da crueldade do álbum não termina no racismo.
Ao longo das cerca de 60 páginas de “Tintim no Congo”, Tintim age como um verdadeiro bárbaro grosseiro, matando indiscriminadamente animais atrás de animais. E, se nalguns casos mata ou fere em legítima defesa (como um tubarão, um crocodilo, uma cobra e um macaco para salvar Milou), noutros a morte é vista com um certo prazer ou envolvida numa piada de mau gosto, como quando pontapeia um macaco e um leopardo (ou o faz engolir uma esponja e lhe dá de beber para esta dilatar), quando mata um elefante para lhe retirar o marfim, quando mata quinze veados por julgar se tratar sempre do mesmo, quando mata um bisonte à pedrada por vingança, ou, finalmente, quando faz explodir um rinoceronte enchendo-lhe a carapaça de dinamite. Esta última cena é de tal forma brutal que, há alguns anos atrás, quando ainda Hergé era vivo (e ele faleceu em 1983), ela foi completamente alterada para a Escandinávia, a pedido da sua editora local, que considerava a cena demasiado bárbara para o público nórdico.
Hergé, numa famosa entrevista a Numa Sadoul, justifica-se desta forma: "eu estava cheio dos preconceitos do meio burguês em que vivia... Era 1930. Eu não conhecia desse país a não ser o que as pessoas contavam na época: «Os negros são crianças grandes... felizmente para eles, nós estamos lá! Etc.» E desenhei-os, os africanos, segundo estes critérios, com o mais puro espírito paternalista, que era o da altura na Bélgica".
No final de contas, tudo bem.
Hergé retratou-se e apontou o livro como "um pecado".
A Comissão fez o que devia. Lutou pelo que acredita, ainda que pareça radical e desmesurado, sobretudo a quem cresceu tendo como amigo-a-quem-tudo-se-perdoa Tintim.
A livraria Borders e a Waterstone's, que tomaram a iniciativa de mudar a obra de secção, também estiveram bem. Tendo o bom-senso de não proibir a obra, alteraram a classificação da mesma, permitindo aos adultos que a queiram consultar e comprar de o fazer. Mas, uma vez que o livro tem cenas claramente excessivas e, pior que isso, coloca como vilão (perante os valores ecológicos e de igualdade contemporâneos) aquele que deve ser o herói, símbolo de toda a valentia na defesa de causas nobres e humanas, as livrarias libertaram as crianças de encontros, desilusões e modelos errados que a obra poderia proporcionar.
É por isso que eu gostaria de saber se, aqueles que consideram esta posição um acto de "puritanismo politicamente correcto", a mando de "sinistros patrulheiros da correcção política", ou os que os confundem com "os maus que queimavam os livros", acham bem que as obras de Guy de Maupassant (reconhecido autor francês da segunda metade de XIX, amigo de Flaubert e Zola), onde se encontram excertos como o que coloquei em epígrafe (e, como devem saber, fui brando na escolha!), também deveriam fazer parte da secção infantil das livrarias.
Bah! Deixemo-nos nós de puritanismos liberais.

P.S. - Gostava de ter escrito esta linha da canção: "I had an uncle who once played for Red Star Belgrad."

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domingo, julho 15, 2007

E era tudo isto

Os jardins do Palácio de Cristal, Porto 4 de Julho de 2007.

Mazzy Star - Fade into you

Paisagem

Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.

Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.

Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento,
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.

Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exaltação afirmativa.

Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre
.
Sophia de Mello Breyner Andresen (1959) Poesia II

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sexta-feira, julho 13, 2007

Grandes Vinhetas # 14

Retirado de "Michel Vaillant - Irish Coffe" (1986) Jean Graton.

Catatonia - Road Rage

Sempre que perspectivei a inclusão de Michel Vaillant na série Grandes Vinhetas, nunca julguei que esta fosse a escolhida. Na minha ideia, a escolha recairia incontornavelmente no n.º 1 da colecção, editado na longínqua década de 50 - "O grande desafio" (1959). Para uma grande parte dos fãs, e também na minha opinião, esse álbum, tão distante no tempo, é de facto de eleição e provavelmente o melhor dos 70 já editados (o último dos quais lançado na passada segunda-feira!). Tem lá tudo o que o autor, Jean Graton, costuma oferecer a rodos: emoção e qualidade no desenho. Mas para além disso, contém, no traço e no ritmo, a espontaneidade e a imaginação natural de quem começa uma carreira que se viria a revelar brilhante, ainda que, por vezes, determinados álbuns se tornem um pouco repetitivos, dada também a limitação temática. Mas para além da frescura e novidade que esse álbum trazia, é aí que pela primeira vez conhecemos Michel, Jean-Pierre e restantes membros da família Vaillant, e também Steve Warson, o enfant terrible de grande parte das histórias, eterno amigo desbragado do herói, que aí o conhece e defronta.
A saga da família de construtores e pilotos de F1 não começa, contudo, com o referido primeiro álbum. Ela inicia antes, nas páginas da revista Tintin (Graton, curiosamente, já havia trabalhado para a rival Spirou), como aliás grande parte da BD de qualidade, em 1957 (2 anos antes de "O grande Desafio") com uma pequena história de apenas quatro pranchas com o título "La 24ème heure".
Jean Graton, que entretanto passou toda a responsabilidade do trabalho para o seu filho Phillipe desde 1994, havia sido fortemente influenciado por seu pai, comissário do "Club Motocycliste Nantais", que o levou em tenra idade a ver as 24 horas de Le Mans. É aliás num álbum dedicado a esse evento que devo a minha iniciação nas histórias da família Vaillant: "O fantasma das 24 horas"(1970), oferecido pelo meu pai em 1980.
Hoje, contudo, espicaçado pelo que aqui havia escrito, decidi centrar-me neste "Irish coffee" e em particular na vinheta acima reproduzida.
Desde logo, o álbum é atípico. Michel e Steve praticamente não aparecem durante todo o livro, remetendo para estrela principal Henri Vaillant, pai de Michel e mentor do império Vaillant. Henri é, desde o primeiro álbum, uma espécie de guia conselheiro dos dois filhos a quem, em tempos que já lá vão, passou o testemunho da Vaillant: a Michel, piloto n.º 1 da marca, a emoção e a correcção nas pistas; a Jean-Pierre, cérebro por trás da empresa, a força e empenho na direcção da fábrica e da equipa.
Mas para além dessa alteração de protagonista, a história não se desenrola em torno de um campeonato de F1 ou de uma qualquer corrida de autódromo, mas num remoto lugar da Irlanda, Connemara, onde uma corrida anual de carros antigos tem lugar desde 1924. A vinheta retrata os momentos antes da partida, revelando o intenso conhecimento de Graton de todo o ambiente em torno das corridas e dos momentos que as antecedem (que se desvenda aliás álbum após álbum), assim como a sua habilidade imensa no desenho ultra realista das máquinas antigas ou na criatividade e talento intermináveis na criação de novos veículos de design arrojado.
Depois de uma fase um pouco desinteressante das Aventuras de Michel Vaillant (que, tirando algumas honrosas excepções, durava desde 1980), este Irish Coffee, de 1986, abriu um novo caminho para a série, que se vinha a revelar um tanto ou quanto repetitiva, por vezes forçada e excessivamente fantasiosa, tornando-se a partir de então mais criativa e alargando as suas fronteiras, espacial e temporalmente.
O mesmo aliás espero para o portuense Circuito da Boavista. Enquanto dado incontornável, que se transforme pelo menos em motor de desenvolvimento da cidade e da região, sem atropelar, com isso, todo um conjunto de elementos patrimoniais, quer naturais quer humanos, nem que faça esquecer, por parte da autarquia, outros eventos tão ou mais importantes que a corrida de calhambeques.

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quinta-feira, julho 12, 2007

Até que o céu...

Miragaia vista dos Jardins do Palácio de Cristal, Porto 4 de Julho de 2007.

Stone Roses - (Song for my) Sugar spun sister

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quarta-feira, julho 11, 2007

Boa Viagem

O morro da Boa Viagem e a ponte da Arrábida, vistos num final de tarde da passada semana do Morro de Santa Catarina, Porto.

Supergrass - Late in the day

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terça-feira, julho 10, 2007

Porto romântico

A capela de Carlos Alberto, nos jardins do Palácio de Cristal, Porto 4 de Julho de 2007.

The Dears - Heartless Romantic

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segunda-feira, julho 09, 2007

Coração

As torres da Lapa, igreja onde reside o coração de D. Pedro IV - o rei liberal - 5 de Julho 2007.

Pulp - The day after the revolution

Nada tenho de visceral contra os automóveis. Mais, entre os livros que estou a ler neste momento encontra-se, na minha mesinha de cabeceira, a BD de Jean Graton "Michel Vaillant - Irish coffee", retratando precisamente uma corrida de automóveis antigos, em Connemara, na Irlanda.
Por isso, não aceito facilmente a crítica "Oh! Tu não gostas de carros!" sempre que manifesto algum desagrado pelo Circuito da Boavista, junto de amigos que me conhecem há muito.
Não discuto as possibilidades de futuro crescimento económico do evento com vantagens para a cidade e até de visibilidade do Porto por esse mundo fora, para além do agrado que poderá oferecer aos adeptos do desporto automóvel no Norte. São boas razões que espero (e estou a ser verdadeiro) se intensifiquem no futuro, caso a corrida de popós se mantenha.
Mas há coisas que me inquietam para além do que o blasfemo Gabriel Silva já apontou (trânsito caótico, moradores desesperados, totalmente cercados. Um ruído permanente de fundo ao jantar [...] péssimo para o «ozono», [...] com o dinheiro dos contribuintes. Da última vez foram 600 mil euros). Aliás já aqui o havia testemunhado ao lamentar a perda patrimonial da cidade, ligada à descaracterização da Avenida da Boavista, assim como todas as trafulhices associadas ao Metro do Porto e ao (suposto) viaduto que será necessário construir sobre o parque da cidade para possibilitar o eléctrico ou o metro, banidos que foram do viaduto desenhado por Solá Morales para que os carris não atrapalhassem as corridinhas.
Mas este fim-de-semana o incómodo é ainda maior. Isto porque se comemoram os 175 anos do desembarque liberal no Pampelido (8 de Julho) e a chegada ao Porto do exército libertador (9 de Julho), despoletando o Cerco do Porto em que a cidade Invicta resistiu, de Julho de 1832 a Agosto de 1833, contra as tropas Miguelistas comandadas pelo poder na capital.
E incomoda porque se procurarmos no site da câmara municipal do Porto (a grande entusiasta dos calhambeques) por alguma referência a esta data, não encontraremos uma única iniciativa à comemoração que chegou a ser equacionada como feriado municipal da Invicta, no princípio do século XX.
Tudo isto de facto me incomoda porque entre os vários momentos gloriosos do Porto, possivelmente esse é de todos o mais simbólico e glorioso. Lutando contra um país inteiro, aqueles homens de fibra (onde se encontravam Garrett, Herculano ou o rei D. Pedro IV), unidos pela causa do liberalismo político trazido pelo vento do Norte, encontraram na cidade o apoio e a resistência contra o absolutismo vindo das bombardas do outro lado do rio e dos inúmeros ataques nas raias do Cerco.
Dessa entrega, dedicação e brio da cidade, os três ilustres referidos jamais se esqueceram.
Garrett, filho do Porto, escreveu um dia que "se na nossa cidade há muito quem troque o b por v, há muito pouco quem troque a liberdade pela servidão".
Herculano, filho adoptado da cidade, avisou a quem não conhece o Porto: "não o julgueis antes de o tratar familiarmente. Não façais cabedal de certo modo áspero e rude que lhe haveis de notar; trazei-o à prova, e achar-lhe-eis um coração bom, generoso e leal. Rudeza e virtude são muitas vezes companheiras; e entre nós, degenerados netos do velho Portugal, talvez seja ele quem guarda ainda maior porção da desbaratada herança do antigo carácter português no que tinha bom, que era muito, e no que tinha mau, que não passava de algumas demasias de orgulho."
Mas de todas as homenagens, talvez a mais bela e emocional da história, fê-la D. Pedro ao entregar o seu coração à cidade, onde ainda repousa mais de 170 anos após a sua morte, na imponente igreja da Lapa.
Por cá, na mesma cidade 175 anos depois, o município não tem uma única iniciativa para recordar esta data - 9 de Julho - que serviu como símbolo de todo um movimento liberal que só veio a terminar em Agosto de 1834, aquando da confirmação pelas Cortes da regência de D. Pedro IV e um ano após a libertação da cidade. Por sua vez, num concelho vizinho, a efeméride é celebrada com empenho, envergonhando a cidade do presidente piloto. Ano após ano, Rio tudo faz para apagar a identidade da cidade, travestindo-a na que ele quer, tantos são os esquecimentos e as omissões em torno de momentos que deveriam ser evocados condignamente, desde os aniversários de Garrett ao 31 de Janeiro de 1891, entre tantas outras.
Fosse este empenho, esta dedicação, esta nobreza de combate marca indelével de alguma cidade mais meridional e até feriado seria, celebrando a integridade e a lealdade de tal urbe. Por aqui, é data a esquecer entre fumo de tubo de escape e ronco de motor.
Mas não desanimem, para além de todos os esforços na corrida de popós, a edilidade já assegurou que estaremos na lista dos recordes com "a maior Árvore de Natal da Europa". A cultura está viva no Porto, deixando um leve odor a PVC e gasolina.
Ai Camilo! Se fosses vivo... muitas linhas corrosivas escreverias!
_______________

A ver:
1 -
Esta fotografia no Magistério6971.
2 -
Este cartoon no Bandeira ao vento.
3 -
Este post do CAA, no Blasfémias.
4 - A
série Benfica-China, no Blogo Existo.
5 -
Esta opinião de Pedro Correia, no Corta-fitas.

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sábado, julho 07, 2007

Indigo

Lordelo do Ouro e a barra do Douro em tons de indigo, visto do alto de Santa Catarina, Porto 4 de Julho de 2007.

Catatonia - Indigo blind

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quinta-feira, julho 05, 2007

Segue o Sol

A ponte da Arrábida, vista dos jardins do Palácio de Cristal, ao final da tarde de hoje.

Ooberman - Follow the sun


Parabéns ao aliado Pedro Olavo Simões pelos óptimos 4 anos a escrever em blogues. Incontornável!

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quarta-feira, julho 04, 2007

O arco íngreme da ponte

A Ponte Maria Pia vista por mim no final de Maio de 2004, a partir da esquecida linha da Alfândega.

The Divine Comedy - Something for the weekend

Já aqui tinha falado da forma como as memórias do meu avô me transportam deliciosa e nostalgicamente para um Porto de outros tempos. Durante um prolongado jantar há um bom par de anos, encaminharam-me para próximo da ponte Maria Pia, na longínqua década de 30, através dos seus olhos profundos, onde a mágoa e a saudade são sempre ultrapassadas por uma gargalhada aberta de episódios absolutamente trágico-hilariantes.
Falou-me das traquinices de duas mãos cheias de amigos que, com sede de façanhas e aventuras, trepavam pelo arco da Ponte de Ferro, enquanto o Zé da Ponte, guarda da linha, com casa do lado de Gaia, os apedrejava com a brita que sustentava os carris, procurando de forma hostil, sempre sem sucesso, desmotivar tal engenho.
No meio daquela horda de travessos, capazes das maiores tropelias, muito além da louca e suicida subida da ponte Maria Pia pelo arco, destacava-se o Ernesto "Manquinho", cingido pela inata ausência de uma mão e dos dois pés. Ernesto era um rapaz doente, que acabou tuberculoso, situação tão comum na densa São Victor de outros tempos, oriundo de uma família massacrada pelos contornos sinuosos da vida, com um irmão também ele problemático e mudo.
Ernesto, ainda que claramente limitado pela sua profunda deficiência física, não só se atirava para o Douro do tabuleiro inferior da ponte Luís I, como executava na perfeição a subida da ponte ferroviária, não com a técnica do meu avô e dos compinchas, mas através de uma arte própria, graças aos mínimos cravos de ferro da ponte, pelos quais, com uma destreza inigualável, trepava pela obra de Eiffel, condicionado ainda pelo concurso de pontaria do Zé da Ponte. Ernesto, o meu avô e os restantes parceiros de brincadeira, visavam atingir de forma célere o "Monte do Seminário", de regresso a casa após os refrescantes mergulhos no Douro em Verões bem mais quentes que este que acabamos de viver.
Desses dez temerários, só sobra o meu octogenário avô. O Ernesto "Manquinho" morreu de tuberculose, numa ilha pequena da Rua de São Victor, agravada por uma valente sova de uns vizinhos de apelido Nobre, por motivos que já ninguém lembra. Os outros, lentamente, um por um, têm partido para lá da Ponte e do Rio, para lá do Porto e da Vida.
Hoje, irónica e perpetuamente, descansam no Prado do Repouso, ali mesmo junto à Ponte de todas as aventuras e proezas.
Não foi contudo nenhuma das subidas alienadas pelo arco de ferro da ponte Maria Pia que conduziram às suas despedidas. A louca fantasia das crianças, ao jeito criativo de Enid Blyton, é sempre mais saudável que a tirana monotonia da rotina dos adultos.

P.S. - Tal como prometido aqui.
_________

Imperdível:
- O texto de Pacheco Pereira sobre a mesma face oriental do Porto, ainda que uns anos depois, no
Abrupto.
- A
resposta de Bruno Sena Martins a Luís Carmelo, numa troca de ideias em que eu também participei nas caixas de comentários.
- A referência à revista K e ao mundo adolescente da transição de décadas 80-90, pelo qual também passei na escola secundária (lembras-te P. Rei?), pelo
André Moura e Cunha.
-
Este texto (e tantos outros...) do Tiago Barbosa Ribeiro, no Kontratempos.
-
Esta recordação hilariante (mais uma!), do Fitzx no Cromos da Bola.
- A celebração dos 4 anos do
Pobo do Norte. Parabéns. Um must!

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domingo, julho 01, 2007

Rusga
(da série São João #6)

As rusgas de São João e o "eléctrico" de Massarelos, anteontem à noite na rua do Dr. Magalhães Lemos.

Blur - Lot 105

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